Trabalhando no Carnaval

É Carnaval! E lá vou eu… trabalhar! Isso mesmo. Aqui, nem de longe se pensa em diminuir o ritmo de trabalho e cair na folia. O Facebook mostra o contraste de dois mundos distintos. Os amigos brasileiros, no maior calor, fantasiados, postando fotos a todo momento da alegria do carnaval, aproveitando troças, blocos, escolas de samba, trios elétricos e batuques diversos. Já os amigos canadenses, totalmente desconectados do que está acontecendo no Brasil, levando sua vida normalmente e aguentando o inverno da melhor maneira possível.

Como por aqui o jeito é continuar trabalhando, uma das coisas que sempre fiz foi ajudar na comunicação com nossos representantes comerciais brasileiros. Sempre que a língua virava uma barreira, as pessoas me pediam ajuda. E lá ia eu pra reuniões com equipes de suporte, vendas ou pré-vendas para fazer a ponte entre os dois lados. Quem já fez esse trabalho de tradução simultânea sabe o cansaço mental que dá. Tinha hora que eu me dirigia à equipe canadense falando português e à brasileira falando inglês… E ainda tinha que aguentar as piadinhas dos dois lados.

Pois bem, numa dessas situações, chega a diretora de suporte da empresa pedindo ajuda pois não está conseguindo contato com os parceiros no Brasil. Era quinta-feira da semana pré-carnavalesca.

Eu, que já vinha acompanhando os meus amigos facebookianos e suas fantasias na semana pré, semana pré-pré, semana pré-pré-pré e por aí vai, já sabia que o país estava em ritmo de carnaval. Ou seja, se os caras não estavam respondendo é porque o problema não era crítico. Podia esperar até a semana depois do carnaval.

Agora, vai explicar isso pra uma pessoa que não tem a menor ideia do que é o carnaval e vive de monitorar métricas.

Chega ela toda estressada:

– Fabio, preciso da sua ajuda com nossos amigos do Brasil. Eles nos passaram um problema com um cliente do Brasil e precisam da resolução urgentemente. Querem fazer um upgrade do ambiente de produção, mas precisam de uma nova versão do nosso software.

Eu tranquilo:

– Sim, mas a versão que está em produção tá rodando direitinho?

– Até onde eu sei, está…

– Ah, então nem se preocupe. Eles já devem estar se preparando para o carnaval. O país inteiro vai parar por uma semana.

– Mas o feriado não é só um dia?

– São dois… e meio… que viram 3. Os outros 2 dias restantes não vão servir pra muita coisa. Quem aparecer no trabalho vai estar ainda em ritmo de carnaval.

– Como assim? Vira a semana inteira de feriado?

– É por aí…

– Não é possível! Vou tentar falar com o fulaninho de novo. Ele disse que era urgente.

E nada de fulaninho… Na sexta, ela voltou dizendo que tinha conseguido falar com o cara que estava no carro indo pra uma praia que não tinha sinal de celular muito bom.

E passei a segunda-feira de carnaval, a terça-feira gorda e a quarta-feira de cinzas com minha colega desesperada. A versão nova estava pronta para ser entregue e não havia ninguém do outro lado para recebê-la. O cliente ia ficar uma arara.

Na quarta-feira logo no início da tarde, ela veio falar comigo de novo:

– Agora já acabou o feriado, né? Posso ligar pra eles!

– Pode tentar, mas acho difícil conseguir resolver alguma coisa – respondi.

Cinco minutos depois, ela está de volta:

– Tem uma mensagem automática que não consigo entender.

Ligamos de novo.

– O escritório está fechado – disse a ela.

Ela então passou a quinta-feira inteira tentando ligar pra o celular do contato dela, o que estava na praia sem sinal de celular. Só dava caixa postal..

Na sexta-feira, o cara ligou pra dizer a ela que não se preocupasse, que o cliente não faria nenhum upgrade na semana de carnaval e na segunda-feira ele estaria de volta ao escritório e resolveria tudo. Estava tudo sob controle. O país voltaria a funcionar na semana seguinte.

Ela olhou pra mim, com uma cara de surpresa total, assimilando que tudo o que eu havia falado na semana anterior era verdade.

– É… você tinha razão… – disse ela resignada.

Fiquei calado, abri os braços, levantei os ombros naquela expressão corporal que diz “o que é que eu posso fazer”. Não falei nada por respeito a ela. Mas no fundo, estava pensando:

– Eu te disse, eu te disse…