É primavera e tudo é felicidade no Canadá! A neve derrete, a temperatura sobe de zero, as pessoas saem de casa novamente. Motos, bicicletas, skates voltam às ruas. Vizinhos que não víamos desde o outono aparecem novamente nas calçadas.
E não são só eles. Os animais que estavam hibernando ou sobrevivendo timidamente durante o inverno também aparecem e provocam uma mudança enorme naquele clima de calmaria do inverno. É época de reprodução e também de tirar a barriga da miséria depois de tantos meses debaixo de gelo.
Quando a neve derrete, você pode observar o estrago que as toupeiras fizeram no seu jardim. Nós costumávamos plantar tulipas, mas depois que descobrimos que elas atraíam as toupeiras, desistimos. Quando a camada de gelo que cobria a grama se foi, vimos que os bulbos não estavam mais lá. Apenas os buracos e a trilha das toupeiras. Além de perder as tulipas, ainda tive que remendar o gramado.
Na época em que morávamos em Newmarket, nosso quintal era virado para uma área verde. Não tínhamos vizinhos de fundo. Aliás, tínhamos: uma marmota.
A toca dela ficava bem atrás da nossa casa. Assim que ela saía da hibernação, a primeira cerca que ela avistava era a nossa. Era um tal de cavar por baixo da cerca para comer as nossas plantas… As marmotas são implacáveis, incansáveis, cheias de energia. Se durante a hibernação, o coração delas só bate de 3 a 4 vezes por minuto, assim que voltam à vida ativa, o número de batimentos cardíacos passa a ser de 90 a 130 por minuto. Cheguei ao ponto de encomendar um caminhão de areia e reforçar o fundo da cerca com arame para evitar as invasões. Uma trabalheira danada…
As marmotas também são conhecidas por prever se o inverno será longo ou se a primavera chegará em breve. No dia 2 de fevereiro, o Dia da Marmota (Groundhog Day), todos os olhares se voltam para os roedores. Se eles saírem da suas tocas, significa que a primavera está chegando. Mas, se colocarem a cabeça de fora e voltarem para dentro, significa que teremos mais 6 semanas de inverno…
Para quem não lembra, o Groundhog Day tem até filme. Bill Murray ficou preso num loop infinito no 2 de fevereiro, sendo forçado a reviver o Dia da Marmota várias vezes.
Ainda na casa de Newmarket, tínhamos como “inquilinos” um casal bem diferente que morava embaixo do deck: uma lebre e um gambá. Quanto mais cobríamos os buracos com pedras, mais eles cavavam e achavam outras entradas. De vez em quando, eles chegavam perto da nossa porta, posando para fotos como se nada estivesse acontecendo.
Guaxinins também rondavam o nosso quintal. Mas, vivos e agéis como são, nunca ficaram pousando parar fotos. Inteligentes, são experts em escalar cercas e muros e abrir os baldes de lixo durante a madrugada. Fazem uma farra tão grande com o lixo nas grandes cidades que a prefeitura de Toronto, onde a população de guaxinins tem crescido exponencialmente, estuda a possibilidade de encomendar novos baldes para a coleta de lixo orgânico com travas mais elaboradas. O objetivo é tornar o manuseio das travas mais fácil para os moradores da cidade e mais difícil para os animais.
Na nossa casa atual, a bicharada continua a nos visitar. Antes de reforçarmos a cerca, lebres chegaram a dar cria no nosso quintal. Louisa adorou! Pegou um filhote no colo e tudo. Mas, como agora temos cachorro, passamos a ter maiores cuidados para evitar uma matança. Os bichinhos recém-nascidos não têm mecanismo de defesa nenhum. São presas facílimas. Se a mãe não estiver por perto, eles nem tentam correr.
Não são só os animais de pequeno e médio porte que aparecem nas cidades. Até ursos podem chegar a visitar a região onde moramos, embora seja uma raridade.
Outro filme com o qual o morador do subúrbio da América do Norte irá se identificar é o Over The Hedge (não tenho a menor ideia de como pode ter sido traduzido para o português) . O filme conta a história dos animais que foram hibernar e quando acordaram, sua floresta foi substituída por um bairro recém-construído. Eles passam então a explorar os quintais das casas, a descobrir o que está do outro lado da cerca.
Enfim, a gente pensa que eles estão invadindo o nosso quintal, mas quem invadiu a terra de quem primeiro?
Mas não são apenas os animais que hibernam que estão com fome.
Os coiotes, por exemplo, depois de passarem o inverno sobrevivendo à base de frutas, plantas e pássaros que tenham perdido o bonde da migração, também tentam tirar o atraso quando a temperatura sobe.
Coiotes são avistados na Grande Toronto com certa frequência. E não é só em Toronto. Em todo o Canadá, os encontros podem ocorrer, seja na cidade de Saskatoon ou na província de Labrador.
A polícia da cidade de Guelph, em Ontario, chegou ao ponto de pedir à população para parar de ligar ao avistar coiotes, pois o número de ligações estava tirando o foco das ligações mais urgentes.
Imagina o cara ligando desesperado para o 911:
– Por favor, vem logo, tem um coiote no meu quintal!!
E o operador:
– Desculpe senhor, temos outras prioridades no momento. Afinal, é só um coiote…
Lobos também são vistos mais frequentemente ao redor das cidades desde a costa de British Columbia até a cidade de Thunder Bay, em Ontario.
Ano retrasado, tivemos o prazer de conhecer os lobos de perto no Wolf Centre em Haliburton . Eles têm até um passeio onde os visitantes entram na floresta para ouvir os lobos uivando. Como não sou o cara mais corajoso da face da terra, preferi não encarar.
Certa vez, sem horário para minhas corridas, saí de casa para dar uma corridinha às 11 horas da noite. Coisa de doido, eu sei. Mas, às vezes, é a única hora em que a loucura da nossa rotina me permite fazer algo para mim mesmo.
Quando cheguei mais ou menos na metade do meu percurso, vi um vulto canino saindo de um arbusto atravessando a rua e seguindo para uma florestinha próxima. Lobo? Coiote? Talvez um cachorro de alguém perdido pela cidade? Obviamente, não fiquei por perto para investigar e dei meia volta imediatamente.
Quando me perguntam se é perigoso andar à noite por aqui por causa de assalto, respondo:
– Não, mas cuidado com os coiotes!
Filho, como é gostoso ler o que vc escreve. Ao menos qdo vc se aposentar, já tem como preencher o tempo; escreva um livro
. Bjo da mamãe coruja.
Como sua mãe disse, escreva um livro. Foi muito bom ler esse artigo, principalmente quando conhecemos e vivemos um pouco desse problema. bj.
Binho, só lembro dia em que vimos uma lebre no quintal. Nós, com o maior cuidado para nos aproximarmos sem afugentá-la, e o Guila, com toda a sua delicadeza, botou a bicha para correr…
hehehe. “Olha o coelho!!” 🙂
Obrigado, pessoal! Livro eu não sei, mas o blog é legal de fazer pois podemos publicar um capítulo de cada vez. 🙂